segunda-feira, 9 de junho de 2014

POLITICANDO

Viva a Copa
Abaixo a Copa

O monumental Estádio Nacional Mané Garrincha
Desde o início das manifestações no ano passado, me posicionei à favor da realização da Copa do Mundo. Afinal era um compromisso internacional assumido pelo Brasil e uma oportunidade de gerar milhares de empregos numa época em que o país luta para não ser contaminado pela recessão que levou para o buraco duas das maiores economias do planetas; Estados Unidos e União Europeia.
           Não é fácil se manter num cenário econômico tão negativo como esse, sem recorrer às medidas tradicionais de arrocho salarial e corte de investimentos, que provocam desemprego em massa, fazendo com que os pobres paguem a conta pela irresponsabilidade dos banqueiros.
          O Brasil vem insistindo numa trajetória diferente, procurando manter empregos e aumentar o poder de compra dos trabalhadores, procurando ampliar um mercado interno deprimido por décadas de medidas de austeridade, que só fizeram o país andar para trás. Um novo mercado interno, mais forte, formado pela alta do salário mínimo e da renda em geral dos trabalhadores, tem o dom de substituir as exportações que antes fazíamos para os países ricos, mantendo as empresas em atividade e a economia girando.
          É uma lógica simples. Nos primeiros momentos da crise, o então governo Lula optou por estimular o consumo, aumentando salários e reduzindo impostos, mas isso tem um limite, pois pode provocar a volta da inflação, coisa que ninguém deseja.
          Ao atingirmos este limite, foi necessário criar grandes programas de investimentos governamentais que injetassem bilhões de Reais na economia, através de obras de infraestrutura que continuem gerando empregos, fazendo a roda da economia girar. A copa veio a calhar, como um desses programas, movimentando grande somas de recursos na construção de estádios, inicialmente, e depois em aeroportos, e obras de mobilidade urbana, que agora começam a ser inauguradas.
          Outros grandes investimentos foram e estão sendo feitos em rodovias, ferrovias e portos, além de um gigantesco investimento em pesquisa de petróleo no pré-sal.
         Mas se tudo isso permitiu que o Brasil não parasse, mergulhando na depressão e no desemprego, mantendo um dos níveis de emprego mais elevados do mundo em plena crise e recuperando décadas de atraso nos investimentos em infraestrutura, por outro lado não permitiu que mantivessemos uma taxa de crescimento alta, embora ainda estejamos crescendo muito acima dos países ricos. É um preço a pagar. Melhor crescer pouco com emprego e distribuição de renda, do que fazer a tradicional "reforma fiscal", cortando custos até que a economia se reequilibre, como estão fazendo os países do hemisfério norte, para depois relançar a economia.
         Tudo bem então. Mas esta semana assisti na TV Câmara, um documentário sobre a construção do Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília, e pela primeira vez fiquei em dúvida sobre os investimentos realizados para esta copa do mundo.
          O documentário foi muito bem feito, acompanhando todas as etapas da construção do estádio, e ouvindo ao longo de todo esse período, políticos, arquitetos, empresários trabalhadores e cidadãos comuns, contra e à favor da obra e da copa.
          Os argumentos mais frequentes contra a construção, eram o preço excessivo do estádio, numa cidade em que o sistema público de saúde é reconhecidamente péssimo, como aliás em todo o Brasil.
          Quem conhece o Hospital de Base, o maior do Distrito Federal, sabe dos horrores que acontecem ali, bem pertinho do gigantesco estádio.
 Pacientes sendo atendidos em macas no Hospital de Base
           O que mais me chocou foi perceber a desonestidade de políticos e empresários ao anunciar, no primeiro momento, o custo de cerca de 650 milhões de reais  para o estádio, e depois admitir que esse preço era só para estrutura, não incluindo cadeiras, painéis eletrônicos, acabamentos em geral e até mesmo o gramado.
           Ficou bem claro que houve desonestidade e má fé, na tentativa de ocultar o preço real da obra. Não se tratou de superfaturamento, desvio de verbas, ou roubo de alguma espécie, mas simplesmente de desperdício de dinheiro público numa obra grande demais para uma cidade que não tem nenhum time de futebol na primeira divisão.
           Comparando-se as necessidades do sistema de saúde com o imenso gasto no estádio, cujo custo final chegou a 1 bilhão 488 milhões de reais, quase três vezes o anunciado no início, realmente é um contrasenso. Quem ganhou com isso? As construtoras, principalmente.
          O próprio Jerome Walcke diz numa entrevista que aquele é um dos melhores estádios do mundo. Um trabalhador diz também que a arena ficou melhor do que o Maracanã. No final ficamos sabendo que o Mané Garrincha é o terceiro estádio mais caro do mundo até hoje.
          As outras novas arenas construídas, ficaram em torno de 40.000 lugares. Porque fazer um estádio para 70.000 lugares, que só perde no Brasil para o Maracanã, numa cidade sem tradição futebolística?
          Não se pode deixar de dar razão aos manifestantes, que protestavam contra a obra monumental, embora se possa lembrar que esses mesmos argumentos foram lançados contra a construção de Brasília, com sua monumentalidade, que depois provou ser uma obra necessária para a ocupação do centro-oeste brasileiro. Podemos ainda argumentar que a construção dos grandes estádios como o Mineirão e o Beira-Rio, durante a década de 1960/70, serviu para elevar o nível do futebol em estados que não tinham grandes times, como Minas e Rio Grande do sul, tirando o esporte do reduzido circuito Rio-São Paulo.
           Aliás, um dos objetivos mais bem sucedidos da FIFA, com seus grandes eventos tem sido popularizar o futebol pelo mundo, difundindo pela Ásia e África, um esporte que era restrito a Europa e América do Sul. Assim, a tendência é que as novas arenas elevem também o nível do futebol em lugares como Bahia, Amazonas, Mato-Grosso e Pernambuco.
           Mas tudo isso ainda não explica o alto luxo do Mané Garrincha. Realmente houve um exagero ali, um gasto excessivo de dinheiro público, e não há como deixar de dar razão aos cidadãos que o comparam com a pobreza dos hospitais públicos. Ainda mais numa cidade governada por um médico, como Agnelo Queiroz.
          Faltou aos manifestantes, porém, compreender que se o estádio não tivesse custado tão caro, de qualquer forma o dinheiro público economizado não teria ido para os hospitais, pois o que impede a saúde pública de oferecer um bom serviço à população não é a Copa do Mundo, mas o sistema privado de saúde que, com a cumplicidade dos médicos que atuam nos dois sistemas, precisa que o sistema público seja ruim para que o privado garanta seus lucros.
          Para melhorar a saúde seria preciso restringir a promiscuidade reinante entre os dois sistemas, que faz com que o médico atenda mal no público e encaminhe o paciente para a clínica da qual ele é sócio. Médico do sistema público tinha que ter dedicação exclusiva, impedido de atuar no sistema privado.
         O próprio SUS é uma ficção, baseada em Conselhos de Saúde que não funcionam, aparelhados por prefeitos e políticos. Uma utopia petista completamente falida.
         Diante dessa realidade, só posso torcer que essa copa acabe logo, para que possamos voltar a nos debruçar sobre nossos problemas. Mas para alguma coisa ela já serviu: mostrar ao povo brasileiro que existem recursos suficientes para fazer as obras que o povo demanda, acordando a consciência do brasileiro para exigir os seus direitos.
         

          
         
          
          

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